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A indevida exigência de Licença de Importação - Caso das Canetas marcadoras de ponta dupla, à base de álcool

  • Foto do escritor: Rogerio Chebabi
    Rogerio Chebabi
  • 14 de out.
  • 3 min de leitura
A indevida exigência de Licença de Importação - Caso das Canetas marcadoras de ponta dupla, à base de álcool

1. Introdução


Em um caso hipotético de fiscalização aduaneira, uma importação de canetas marcadoras de ponta dupla, à base de álcool, foi indevidamente submetida à exigência de Licença de Importação (LI) sob o fundamento de possível certificação compulsória do INMETRO. A autoridade fiscal entendeu que o produto poderia se enquadrar como artigo escolar ou, alternativamente, como brinquedo.


O caso, contudo, revela um equívoco interpretativo comum na aplicação das normas técnicas às operações de comércio exterior — equívoco que compromete tanto a segurança jurídica quanto a fluidez das importações legítimas.


2. O contexto fático e o erro de enquadramento


O produto importado consistia em canetas marcadoras utilizadas para personalização corporativa (com logotipia de empresas para serem dadas como brindes) — instrumentos de escrita à base de álcool, utilizados em campanhas publicitárias e ações de marketing.


As mercadorias eram personalizadas com logotipos empresariais, sem qualquer destinação escolar, lúdica ou recreativa. Ainda assim, a fiscalização condicionou o desembaraço aduaneiro à apresentação de certificação de conformidade do INMETRO, alegando que as canetas poderiam se enquadrar como artigos escolares ou brinquedos ofertados como brindes.


Tal exigência baseou-se unicamente na classificação fiscal (NCM 9608.20.00), desconsiderando o elemento essencial de ambas as portarias: a destinação do produto ao público infantil.


3. O conceito normativo de “artigo escolar” e a inaplicabilidade da Portaria nº 423/2021


A Portaria INMETRO nº 423/2021 aprova o Regulamento de Avaliação da Conformidade para Artigos Escolares e, em seu item 4.1 do Anexo I, define:


“Artigo Escolar – Qualquer objeto ou material, podendo ser produzido com motivos ou personagens infantis, projetado para uso por crianças menores de 14 anos, com ou sem funcionalidade lúdica, a ser utilizado no ambiente escolar e/ou em atividades educativas.”


A redação é inequívoca: o regulamento se aplica exclusivamente a produtos projetados para uso por crianças menores de 14 anos, em ambiente escolar ou em atividades educativas.


Portanto, produtos de uso profissional, artístico ou promocional, ainda que pertençam à mesma NCM de alguns artigos escolares, não se enquadram na obrigatoriedade de certificação. O fator determinante é a destinação do uso, e não a mera semelhança física ou classificação tarifária.


No caso em exame, o produto é instrumento de escrita de uso adulto, promocional e corporativo, sem qualquer característica infantil ou educativa. Assim, não há fundamento jurídico para a imposição da LI com base na Portaria nº 423/2021.


4. O alcance real do art. 4º, § 1º, III da Portaria INMETRO nº 302/2021 (Brinquedos)


A Portaria INMETRO nº 302/2021 estabelece os requisitos de conformidade para brinquedos.

Seu art. 4º e parágrafo 1º dispõem:


Art. 4º Os brinquedos, objetos deste Regulamento, deverão ser fabricados, importados, distribuídos e comercializados de forma a não oferecerem riscos que comprometam a segurança do usuário, independentemente do atendimento integral aos requisitos ora publicados.


§ 1º Aplica-se o presente Regulamento:

I – Aos brinquedos novos, projetados ou destinados ao uso por crianças de até 14 (quatorze) anos;

II – Aos produtos listados no Anexo IV;

III – Aos brinquedos ofertados como brindes;

IV – Aos brinquedos distribuídos ou comercializados em promoções sazonais;

V – Aos brinquedos anexados a produtos que não são considerados brinquedos.


A redação é cristalina: o inciso III não se refere a “brindes” de modo geral, mas a brinquedos que, porventura, sejam ofertados sob a forma de brinde.


O núcleo da norma é o substantivo “brinquedos”, não “brindes”.


Dessa forma, a certificação compulsória é obrigatória somente para produtos que sejam brinquedos em essência, ainda que distribuídos gratuitamente.


O adendo “ofertados como brindes” apenas descreve a modalidade de distribuição, sem alterar a natureza do produto regulado.


A interpretação extensiva — para abranger qualquer brinde promocional — viola a técnica legislativa e o princípio da tipicidade administrativa, segundo o qual a incidência normativa deve restringir-se ao exato comando do texto legal.



5. Conclusão


O caso evidencia um erro material de enquadramento decorrente de interpretação ampliativa indevida das Portarias INMETRO nº 423/2021 e nº 302/2021.A exigência de Licença de Importação não encontra suporte técnico nem jurídico, uma vez que o produto importado:


  • não é artigo escolar (não destinado a crianças nem usado em ambiente educativo);

  • não é brinquedo (não tem função lúdica nem apelo infantil);

  • e, portanto, não se sujeita a certificação compulsória.


Em verdade, trata-se de brinde corporativo adulto, instrumento de escrita de uso profissional, inserido na economia da publicidade e da comunicação institucional.


A correta aplicação das normas de conformidade técnica deve observar o escopo e a finalidade do regulamento, sob pena de violação ao princípio da legalidade e ao devido processo administrativo aduaneiro.


O caso hipotético ora analisado reforça a necessidade de interpretação restritiva e técnica das portarias do INMETRO, garantindo que o controle aduaneiro preserve a segurança, mas sem sufocar a racionalidade comercial e o devido processo legal na importação.


Rogerio Zarattini Chebabi

OAB/SP 175.402




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