Greve da Receita: quem paga o prejuízo do importador?
- Isabelle Gadioli
- 1 de ago.
- 3 min de leitura

ISABELLE CRISTINA GADIOLI G DA SILVA
Advogada, OAB/SP 484.701
E-mail: isabelle@chebabi.net
Nos últimos meses, diversas empresas brasileiras foram diretamente prejudicadas pela chamada "operação padrão" da Receita Federal, que se trata de greve adotada pelos auditores-fiscais, que impacta diretamente nos trâmites aduaneiros devido à redução drástica no fluxo de trabalho, paralisando etapas importantes da liberação de mercadorias.
Mesmo com toda a documentação em ordem, muitas cargas ficaram paradas por semanas nos portos e aeroportos, gerando custos com armazenagem, perda de contratos, impacto na produção e até mesmo descredibilidade perante clientes/fornecedores.
A resposta é clara: a União Federal, por meio da Receita Federal do Brasil, deve indenizar as empresas prejudicadas. E explico por quê.
1. O dever da Administração Pública de prestar um serviço eficiente
A Constituição Federal determina que todo órgão público tem o dever de prestar seus serviços com eficiência, continuidade e dentro de prazos razoáveis.
Ou seja, o Fisco não pode simplesmente parar de atender os contribuintes por causa de greves, férias ou acúmulo de trabalho. Se isso ocorrer e causar prejuízo ao contribuinte que agiu corretamente, o Estado responde por esse dano, como já está previsto na Constituição em seu art. 37, §6º.
2. Não importa se houve culpa: a responsabilidade é objetiva
No caso de órgãos públicos, a lei prevê o chamado "dever de indenizar independentemente de culpa". Basta que fiquem provados três pontos:
O que aconteceu (a Receita demorou para liberar as cargas);
O que isso causou (prejuízo financeiro com armazenagem ou paralisação de produção);
Qual foi a ligação entre uma coisa e outra (o atraso da Receita foi o motivo direto do prejuízo).
Esses três elementos já são comprovados por documentos que mostram quando as Declarações de Importação foram registradas e quando as cargas, de fato, foram liberadas, e em muitos casos, com atrasos superiores a 30 dias.
3. A greve da Receita é problema da Administração — não do contribuinte
A chamada “operação padrão” é um movimento interno dos auditores-fiscais, que reduz o número de liberações por dia como forma de pressão por reajustes e reestruturações de carreira.
Ainda que se trate de uma reivindicação legítima da categoria, isso não pode recair sobre o contribuinte, que:
Já pagou tributos;
Já entregou os documentos;
E precisa da carga para operar e cumprir com seus próprios contratos.
A Administração Pública sabia da greve (pois ela foi anunciada com antecedência), e tinha o dever de se organizar para evitar prejuízos a terceiros. Como isso não aconteceu, a responsabilidade recai sobre ela.
4. O contribuinte não pode ser penalizado por falhas do sistema público
Muitas empresas vêm sendo obrigadas a pagar valores altíssimos de armazenagem, demurrage e até indenizações a clientes por atrasos causados única e exclusivamente pela lentidão da Receita Federal.
A tese que a ser defendida judicialmente é::
“Se a Receita Federal parou de operar como deveria, e isso causou prejuízo à empresa importadora, a União deve indenizar esse prejuízo.”
Assim, o pedido é de devolução desses valores — atualizados e com juros — diretamente pela União, que foi quem falhou no dever de prestar o serviço dentro do prazo legal.
Aqui entram não só demurrage e armazenagem, como também danos morais e lucros cessantes.
Conclusão
O Judiciário já reconhece que, quando o contribuinte faz a sua parte, e a Receita Federal deixa de cumprir a dela por razões internas (como greve ou má gestão), o prejuízo não pode ser transferido ao importador.
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