Revisão de Estimativa (Radar) e a Admissibilidade da Conta Garantida como Prova da Capacidade Financeira
- Rogerio Chebabi

- 28 de jul.
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1. Introdução
A habilitação para atuar no comércio exterior (RADAR), em especial no módulo de importação do Siscomex, exige demonstração da capacidade financeira da empresa interessada, conforme determina a Instrução Normativa RFB nº 1.984/2020.
No contexto da revisão de estimativa de capacidade financeira, o exame documental recai sob a égide da Portaria Coana nº 72/2020, cujas diretrizes processuais devem ser interpretadas à luz do interesse público, da razoabilidade e da legalidade.
Dentre os dispositivos mais relevantes da Portaria, destaca-se o Art. 9º, que delimita os critérios de análise dos elementos probatórios. A presente análise dedica-se a esse dispositivo, especialmente ao seu parágrafo único, discutindo-se a admissibilidade da Conta Garantida, instrumento financeiro de crédito rotativo, como elemento idôneo para a comprovação da capacidade financeira do requerente.
2. O Artigo 9º da Portaria Coana nº 72/2020: Conteúdo e Finalidade
O caput do artigo 9º dispõe que:
Da Análise da Documentação Instrutória
Art. 9º No curso da análise documental de que trata o art. 31 Instrução Normativa nº 1.984, de 2020, será verificada a correta instrução do requerimento de revisão de estimativa conforme disposto na Seção II deste Capítulo, especialmente quanto à:
I - presença dos documentos obrigatórios, de acordo com as hipóteses de revisão previstas no art. 4º, os quais devem ter sido juntados estritamente de acordo com as orientações dispostas no Anexo Único; e
II - conformidade dos documentos juntados, cujos títulos devem corresponder ao seu conteúdo material.
Porém, é no parágrafo único que se encontra a válvula de escape normativa:
Parágrafo Único - Em casos justificados, poderão ser considerados, a critério do titular da Unidade, outros elementos de fato e de direito não previstos nesta portaria, para fins de comprovação da capacidade econômica, financeira e operacional do interessado e deferimento do pedido de revisão de estimativa
Esse dispositivo consagra o princípio da instrumentalidade das formas, afastando o formalismo excessivo e conferindo ao gestor público a prerrogativa de avaliar a real suficiência econômica do contribuinte por meios alternativos de prova, desde que adequadamente justificados.
3. A Conta Garantida: Natureza Jurídica e Características
A Conta Garantida, formalizada por meio de Cédula de Crédito Bancário (CCB), é uma linha de crédito rotativo pactuada entre a empresa e a instituição financeira, cujos recursos podem ser acessados a qualquer tempo, mediante simples solicitação. Seus principais atributos são:
Liquidez imediata;
Ausência de trâmite adicional para liberação;
Formalização contratual com força de título executivo extrajudicial (nos termos do art. 28 da Lei nº 10.931/2004);
Reserva de crédito disponível, mesmo que ainda não utilizada.
Embora não represente saldo em conta-corrente em sentido estrito, a Conta Garantida integra o conjunto patrimonial da empresa como crédito certo, líquido e exigível, podendo ser mobilizado para cumprimento de obrigações aduaneiras ou operacionais no comércio exterior.
4. Fundamentação Jurídico-Administrativa para sua Aceitação
A Portaria Coana nº 72/2020 não veda o uso de instrumentos financeiros alternativos como meios de comprovação da capacidade financeira. Ao contrário, seu parágrafo único estimula uma abordagem casuística, ponderada e discricionária, permitindo que o auditor fiscal avalie a suficiência econômica do contribuinte com base na realidade material dos documentos apresentados.
Trata-se de uma autorização expressa para a interpretação teleológica do procedimento administrativo, visando atender à finalidade do sistema de habilitação: garantir que o operador disponha de meios para arcar com os custos inerentes às operações de comércio exterior (tributos, fretes, armazenagens, seguros etc.).
Nesse sentido, a Conta Garantida:
Equivale a um ativo financeiro rotativo;
É dotada de instrumentalidade jurídica robusta, por meio da CCB;
Representa risco pré-aprovado, já avaliado pelo setor bancário, cuja expertise em análise de crédito deve ser presumida;
É usualmente utilizada como linha de capital de giro por empresas atuantes no setor de comércio exterior.
5. Conclusão
O artigo 9º da Portaria COANA nº 72/2020, especialmente seu parágrafo único, representa um avanço na flexibilidade administrativa, permitindo a incorporação de provas inovadoras como a Cédula de Crédito Bancário em conta garantida para comprovar capacidade financeira no comércio exterior. Essa abordagem harmoniza a rigidez normativa com a dinâmica econômica das empresas, promovendo o desenvolvimento do setor sem prejuízo à arrecadação. Recomenda-se que os operadores, ao pleitearem revisões de estimativa, fundamentem detalhadamente a utilização de tais instrumentos, invocando a discricionariedade administrativa para uma análise casuística. Assim, consolida-se uma interpretação progressiva do Direito Aduaneiro, alinhada aos princípios de eficiência e razoabilidade.
Rogerio Zarattini Chebabi
OAB/SP 175.402


























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